Dobro de casos e de óbitos por Covid-19 em uma semana na região de Campinas (Foto Adriano Rosa)

Agravamento da pandemia reforça urgência de ações integradas na região de Campinas

Por José Pedro S.Martins

Dois relatórios que acabam de ser divulgados sobre a Covid-19, pelo Ministério da Saúde e pelo IBGE, reforçam a urgência de ações mais integradas entre os governos municipais na Região Metropolitana de Campinas (RMC) para combater a pandemia, que se agrava a cada dia. Do mesmo modo, os documentos apontam para a relevância de uma cooperação mais próxima entre o poder público e os integrantes do polo científico e tecnológico existente na região, e também entre o poder público e o setor privado, para que sejam mais eficazes as iniciativas para conter o novo coronavírus e proteger as populações mais vulneráveis, como os idosos.

O Boletim Epidemiológico 15 sobre o novo Coronavírus, divulgado pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde (correspondente à Semana Epidemiológica 19, de 03 a 09 de maio de 2020), confirmou a progressão da pandemia na Região Metropolitana de Campinas e demais polos do interior, depois da explosão de casos nas grandes metrópoles como São Paulo. Foram 971 casos confirmados na RMC, com 48 óbitos, na Semana Epidemiológica 19, contra 408 casos confirmados e 26 óbitos na semana anterior, isso sem contar possível subnotificação.

a mortalidade e a incidência de casos graves em populações com mais de 60 anos são significativamente maiores, demandando ações específicas do sistema de Saúde (Notas Técnicas do IBGE Covid-19)

O documento do Ministério da Saúde também registrou o aumento proporcional dos casos confirmados e da mortalidade por Covid-19 na RMC. Na Semana Epidemiológica 19, foi registrada a incidência de 299,3 casos de Covid-19 por 1 milhão de habitantes na RMC, contra a proporção de 125,8 por 1 milhão na semana anterior. Da mesma forma, na Semana Epidemiológica 19 foi documentada a taxa de 14,8 óbitos pro Covid-19 por 1 milhão de habitantes na RMC, contra a taxa de 8,0 mortes por 1 milhão na semana anterior. A RMC é composta por 20 municípios, onde vivem 3,2 milhões de moradores.

Se ocorre um incremento substancial de casos e de óbitos por Covid-19 na RMC, é maior o risco para os grupos populacionais com idade igual ou superior a 60 anos, cuja dimensão foi apontada nas notas técnicas que o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou como subsídios para as estratégias de combate à pandemia. Segundo essas notas técnicas, o Arranjo Populacional de Campinas (correspondente a um número de municípios menor do que a RMC, com 1,8 milhão de moradores) tinha 11% de sua população de idosos. Eram 202.608 idosos em 2010, segundo os documentos do IBGE. O Arranjo Populacional de Campinas é composto pelos municípios de Campinas, Sumaré, Hortolândia, Monte Mor, Paulínia, Valinhos, Cosmópolis e Vinhedo. A RMC abrange ainda Americana, Artur Nogueira, Engenheiro Coelho, Holambra, Indaiatuba, Itatiba, Jaguariúna, Morungaba, Nova Odessa, Pedreira, Santo Antônio de Posse e Santa Bárbara D´Oeste.

As notas técnicas do IBGE indicam que o Arranjo Populacional de Campinas estava em terceiro lugar, entre 14 arranjos com mais de 1 milhão de habitantes, em proporção de médicos em relação à população. Entretanto, o mesmo Arranjo tem posição somente intermediária – em comparação com os demais arranjos com mais de 1 milhão de habitantes – em termos de respiradores, enfermeiros e leitos de Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

Os documentos do IBGE ressaltam a importância de atenção com a população idosa nas estratégias de combate à Covid-19. A proporção de população idosa “é uma variável relevante no que diz respeito aos impactos potenciais da pandemia da Covid-19, dado que a mortalidade e a incidência de casos graves em populações com mais de 60 anos são significativamente maiores, demandando ações específicas do sistema de Saúde”, afirma um trecho das notas técnicas.

Carmen Lavras: “Todos ganham com uma ação mais integrada”

Urgência de ações mais integradas

Os documentos dos órgãos do governo federal, confirmando o significativo avanço da Covid-19 na RMC, reiteram a urgência de ações mais integradas entre os 20 municípios da Região Metropolitana de Campinas, para evitar um agravamento ainda maior do cenário nas próximas semanas. Exatamente no próximo dia 19 de junho, serão lembrados os 20 anos de criação da Região Metropolitana de Campinas, nos termos da Lei Complementar Estadual nº 870. A RMC foi criada exatamente para viabilizar ações integradas entre os municípios componentes.

Ex-secretária municipal da Saúde de Campinas, e pesquisadora do Núcleo de Estudos de Políticas Públicas (NEPP) da Unicamp, a médica sanitarista Carmen Lavras concorda em que seria um passo importante uma maior integração intermunicipal para a definição de estratégias de combate à Covid-19. “É relevante uma maior articulação entre os municípios, em todas as etapas de enfrentamento dessa epidemia, inclusive no momento de definição de estratégias visando eventual relaxamento do isolamento social. O vírus circula além das fronteiras municipais e as pessoas transitam pela região e compartilham muitos dos serviços de saúde aí existentes. Todos ganhariam com uma ação mais integrada”, comenta a pesquisadora.

É relevante uma maior articulação entre os municípios, em todas as etapas de enfrentamento dessa epidemia (Carmen Lavras, coordenadora do Programa de Estudos de Sistemas de Saúde do NEPP-Unicamp)

Uma maior cooperação entre o poder público e o polo científico e tecnológico da Região Metropolitana de Campinas, para a qualificação do combate à Covid-19, também conta com o apoio de Carmen Lavras, que coordena no NEPP o Programa de Estudos de Sistemas de Saúde. “Temos infectologistas, imunologistas, epidemiologistas e outros especialistas altamente qualificados, que podem contribuir muito na discussão e definição de ações estratégicas de combate a pandemia”, destaca a pesquisadora, lembrando a posição de destaque do polo científico e tecnológico localizado na RMC.

De fato, importantes pesquisas relacionadas à Covid-19 estão em curso na RMC, envolvendo, entre outros, o Laboratório de Estudos de Vírus Emergentes (LEVE), do Instituto de Biologia da Unicamp, e o Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (CNPEM), ambos localizados em Campinas (ver reportagem no Portal Longevinews aqui). Outras instituições também estão atuando no combate à pandemia. Pesquisadores do Instituto Agronômico, por exemplo, têm contribuído com a discussão relacionada ao uso de Equipamento de Proteção Individual (EPI) na agricultura, como prevenção ao novo coronavírus.

Papel central do SUS

Para a pesquisadora do NEPP da Unicamp, Carmen Lavras, a pandemia de Covid-19 tem ratificado o papel central do Sistema Único de Saúde (SUS) para a proteção de toda a população brasileira.  “Apesar do subfinanciamento do qual é vítima desde a sua criação, o SUS é fundamental, porque está presente em todo território nacional, e sem ele a situação seria consideravelmente mais grave”, defende a pesquisadora.

Na sua opinião, o isolamento social é essencial no enfrentamento da pandemia. “Isto ficou claro em todos os países. O isolamento é fundamental para que os sistemas de saúde se preparem melhor para enfrentar a pandemia, pois nenhum deles estava de fato preparado para um vírus desconhecido até há pouco tempo, com alto índice de contaminação e letalidade. Sem o isolamento, colocamos em risco as vidas não só dos pacientes portadores de Covid, mas de todos aqueles que, portadores de outras patologias, possam em algum momento necessitar de atendimento hospitalar especializado”, comenta Carmen Lavras.

Nesse sentido, a especialista lamenta a postura do presidente da República, Jair Bolsonaro. “As suas posições deixam muitas pessoas em dúvida quanto à importância do isolamento social, na contramão do que pensam quase todos os líderes mundiais”, afirma a pesquisadora do NEPP-Unicamp.

Sem o isolamento, colocamos em risco as vidas não só dos pacientes portadores de Covid, mas de todos aqueles que, portadores de outras patologias, possam em algum momento necessitar de atendimento hospitalar especializado (Carmen Lavras)

Ela também lamentou a troca do comando no Ministério da Saúde, no auge da pandemia de Covid-19 no Brasil. “Não se trata apenas de trocar o ministro. Toda uma equipe com muitos anos no SUS foi trocada e isso pode afetar todo o planejamento e a capacidade do Ministério no enfrentamento dessa pandemia”, alerta.

Carmen Lavras também defende uma ação mais integrada entre o poder público e o setor privado para o combate à pandemia, considerando que a rede hospitalar privada é expressiva no país. Ela foi coordenadora do NEPP-Unicamp por dois mandatos consecutivos, entre 2011 e 2016. Carmen Lavras é ex-professora da PUC-Campinas. Entre outras pesquisas no NEPP, coordenou o Diagnóstico de Saúde de 11 Regiões de Saúde do Estado de São Paulo.

  1. Sempre pertinente é competente em duas propostas, as ações integradas a cada dia se torna mais premente na gestão do SUS, já temos tecnologia para isto, agora precisamos de maturidade. O modelo sanitário tem a saúde do usuário como foco e não a doença. Parabéns !

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