Entrevista: Dra. Ivete Berkenbrock, a nova presidente da SBGG

A edição #07 do Podcast LongeviNews traz uma entrevista exclusiva com a médica geriatra IVETE BERKENBROCK, recém-eleita presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia (SBGG). Ouça no player acima (clique na opção “ouvir no navegador” se o áudio não reproduzir automaticamente).

Graduada em Medicina pela Universidade de Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, com especialização em Geriatria e Gerontologia pela SBGG e Conselho Federal de Medicina, Ivete é também especialista em Clínica Médica, Saúde Pública e Saúde Coletiva. Além de atender em seu consultório em Curitiba, atua como coordenadora da Saúde da Pessoa Idosa da Prefeitura Municipal da capital paranaense e exerce atividades docentes na Especialização em Gerontologia da Universidade Tuiuti do Paraná.

Eleita para presidir a SBGG na gestão 2021-2023, Ivete assume a instituição no momento em que geriatras, gerontólogos, organizações e ativistas dos direitos dos idosos em âmbito mundial debatem intensamente a proposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de inserção da velhice como doença na Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde (CID 11), a partir de janeiro de 2022 (clique aqui para saber mais).

“A SBGG é contra essa denominação e está envidando esforços em conjunto com outros grupos da sociedade civil brasileira para mostrar à OMS a inadequação do termo”, afirma a especialista na entrevista concedida ao editor do Portal LongeviNews, Paulo Cesar Nascimento.

“Entendemos que a velhice é uma fase da vida, que pode, sim, cursar com doença ou não, mas isso não significa que quanto mais longeva a pessoa seja considerada doente. Ela será doente se tiver alguma doença, como diabetes, hipertensão, artrose, artrite, pneumonia. Então isso é uma doença numa pessoa idosa, não que a idade caracterize uma doença”, enfatiza Ivete.

Perda de dados epidemiológicos

De acordo com ela, a nova classificação pode resultar em um retrocesso nos esforços de construção de uma imagem positiva do envelhecimento e levar à perda importante de dados epidemiológicos, que possibilitam conhecer a incidência de doenças em determinada região ou mesmo dentro de uma própria população.

“O CID é muito importante, porque ele fornece uma linguagem comum para relatar e monitorar doenças. Isso permite que o mundo colete, armazene e compartilhe dados de uma forma consistente e padronizada, entre hospitais, regiões, países, ao longo de períodos de tempo, contribuindo para a análise e a tomada de decisões baseadas em evidências. É a nossa principal ferramenta epidemiológica no cotidiano, de muita responsabilidade para o médico”, esclarece a geriatra na entrevista. Ela também adverte:

“O fato de existir um CID tão fácil, em que você ache lá velhice para explicar as múltiplas comorbidades ou doenças de um paciente, acarreta um medo muito grande disso se tornar um hábito entre profissionais mal preparados. Além do que nós estaremos cometendo o idadismo, que é o preconceito contra a idade, como se o simples fato de se ter alcançado 60 anos aqui no Brasil possa ser considerado uma doença”.

A nova presidente da SBGG expressa ainda a preocupação sobre a quem pode interessar uma proposta que passe a enxergar a velhice apenas como um diagnóstico clínico:

“Nós lutamos contra uma indústria gigantesca que tenta promover medicamentos para retardar o envelhecimento, a indústria do antiageing, que terá um campo excelente para a disseminação dessa prática, que não é considerada nem ética nem eficaz”.

Ela complementa:

“Não existe essa questão de curar o envelhecimento, porque velhice não é doença, o que se busca são medidas e ações que possibilitem um envelhecimento com menores incapacidades, com menores danos, mas não impedir o envelhecimento. Então, os mal-intencionados podem provocar essa corrida pela fonte da juventude, pelo antienvelhecimento, pelo combate a uma doença que efetivamente não existe”.

Políticas públicas equitativas

Ivete Berkenbrock também comentou a respeito da intenção da nova diretoria da SBGG de contribuir na construção de políticas públicas relacionadas à atenção à saúde da pessoa idosa no Brasil, que segundo ela não tem acompanhado nem o aumento da expectativa de vida no país nem o crescimento da população idosa, hoje superior a 32 milhões de pessoas acima de 60 anos.

O propósito da entidade, conforme salienta, é ajudar a construir políticas que permitam a promoção da saúde por meio do controle mais efetivo das doenças crônicas, por meio de cuidados ao longo dos diferentes ciclos da vida, mas que se intensifique ou pelo menos que contemple as necessidades das pessoas idosas, e também por meio da implementação de cuidados paliativos, com acesso a toda a população, de forma que as pessoas consigam sobreviver até idades mais longevas. Ela argumenta:

“São políticas que precisam ser no mínimo equitativas, para alcançar todas as populações, não só das metrópoles, das cidades que tenham já uma estrutura, mas também aquela população idosa que mora em lugares muito distantes e de difícil acesso. Sabemos que hoje 75% da nossa população é usuária do SUS, isso na média, em alguns lugares 100% da população depende das políticas públicas do SUS, então é para essa população como um todo que nós queremos ajudar a construir essas políticas”.

Câncer, ILPIs e os 60 anos da SBGG

A entrevista com a geriatra aborda ainda o crescimento em ritmo acelerado no Brasil da incidência de câncer em pessoas acima de 60 anos e a importância da prevenção.

“O envelhecimento é um desafio, porque trouxe conquistas, mas também a possibilidade de, pelo maior tempo de sobrevida, ter mais chances de aparecer doenças que antes não apareciam em fases mais jovens”, comenta Ivete.

De acordo com ela, maus hábitos, como tabagismo e alcoolismo, a parte genética e a condição imunológica fazem com que pessoas com mais de 65 anos estejam onze vezes mais propensas a desenvolver uma doença cancerígena do que aquelas com idade inferior, segundo estatísticas do Instituto Nacional do Câncer (INCA).

Outros temas da conversa com Ivete Berkenbrock são: a iniciativa da SBGG de apoiar o segmento das Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) por meio do incentivo à publicação de trabalhos de pesquisa relacionados ao setor em sua revista científica; as perspectivas para a população idosa no pós-pandemia; e as contribuições que a instituição vem proporcionando ao avanço da Geriatria e da Gerontologia no Brasil ao longo de 60 anos de atividades, comemorados este ano.

Ouça o podcast com a entrevista completa no player no alto desta página (clique na opção “ouvir no navegador” se o áudio não reproduzir automaticamente).

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