Brasília: direitos das pessoas idosas em debate (Foto Adriano Rosa)

Pessoas Idosas: Governo Lula recebe críticas por processo de recomposição do Conselho Nacional

Campinas, 15 de agosto de 2023 – No dia 26 de julho foram eleitas as entidades da sociedade civil que vão compor o novo Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDPI). As eleições foram realizadas pelo Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Na atual gestão, do governo de Luis Inácio Lula da Silva, o número de entidades no CNDPI subiu de 14 para 18. Entretanto, o processo de recomposição do Conselho Nacional pelo governo Lula vem recebendo críticas por parte de lideranças históricas do movimento em defesa dos direitos das pessoas idosas.

Nas eleições de 26 de julho, quatro segmentos que ainda não eram representados no Conselho Nacional elegeram seus representantes: igualdade racial, mulheres, população LGBTQI+ e Povos Indígenas. A posse do CNDPI recomposto, após o Conselho legítimo ter sido destituído pelo governo de Jair Bolsonaro, será no dia 22 de agosto.

Críticas ao processo

O Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, assim como todos os órgãos colegiados anteriores, foram extintos ou desfigurados pelo ex-presidente Bolsonaro, como noticiou o Portal Longevinews. No dia 11 de abril de 2019, o Decreto Nº 9.759, assinado pelo ex-presidente, extinguiu e estabeleceu diretrizes, regras e limitações para colegiados da administração pública federal. Entre os colegiados atingidos pelo Decreto estava o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDI), o que gerou reação imediata entre organizações e profissionais do setor. O Decreto Nº 9.759 estabelecia que os colegiados da administração pública federal seriam extintos a partir do dia 28 de junho de 2019.

Pelos termos do Decreto n.º 9.893 o CNDI foi mantido, mas com composição totalmente reduzida, com mudanças em suas atribuições e participação somente do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos entre os representantes governamentais.  Desde então, o movimento em defesa dos direitos das pessoas idosas passou a lutar pela recomposição do Conselho nos moldes originais, assegurando plena participação da sociedade civil.

Com a eleição do presidente Lula, a expectativa era de que novos tempos chegariam em termos da participação social nas diferentes instâncias governamentais. No dia 6 de abril de 2023, o governo Lula publicou o Decreto 11.483/2023, dispondo sobre o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa. Termos do decreto foram criticados em uma Carta Aberta, assinada por ex-presidentes e ex-vice-presidentes do Conselho Nacional.

Assinaram o documento, datado de 14 de abril de 2023 e publicado em Campinas: Maria Lucia Secoti Filizola – Presidente do CNDI, Biênio 2018-2020/Destituída pelo Decreto 9893/2019; Maria do Socorro Medeiros Morais – Ex-Presidente do CNDI, Biênio 2016-2018, e Ex-Secretária Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa; Jose Luiz Telles – Ex-Presidente do CNDI, Biênio 2008-2010; Bahij Amin Aur – Ex-Vice-Presidente do CNDI, Biênio 2016-2018.

Os signatários começam o documento exaltando “o retorno da transversalidade do envelhecimento e a alternância na presidência do colegiado”. Logo em seguida, entretanto, já começam as críticas ao processo de recomposição do Conselho Nacional: “Todavia, como todos que clamam por um Estado Democrático de Direito, se manifestam com veemência contra a não transparência de todo o processo que levou à desejada revogação do Decreto nº 9.893/2019″.

Seguem os argumentos dos signatários: “Primeiramente, o Decreto nº 11.483/2023 desconsidera o relevante serviço prestado por mais de duas décadas por esse colegiado, a começar pela mudança da consagrada sigla “CNDI” feita de forma unilateral. Vale destacar que a sua permanência, após alteração do nome do colegiado para “Pessoas Idosas”, ocorreu por meio de deliberação, na gestão 2016-2018, e em respeito ao colegiado, então legitimamente constituído, será assim nomeado neste documento”.

O documento prossegue: “A sociedade civil, ciente da sua responsabilidade, sustentou quatro anos de luta contra uma medida nefasta que mutilou o CNDI. Por essa razão, ficamos perplexos, pois, apesar de haver um entendimento consolidado na sociedade civil sobre a imediata revogação daquele ato normativo antidemocrático, somente às vésperas dos 100 primeiros dias de governo que preza pela participação cidadã, foi dado a conhecer o Decreto nº 11.483/2023”.

As críticas continuam: “Não podemos deixar de registrar que, lamentavelmente, ele foi redigido em gabinetes, de costas para sociedade civil, contrariando o que acompanhamos em outros colegiados e o que, enfaticamente, prega o Senhor Presidente da República. Com estranheza, vemos dois pesos e duas medidas nessa retomada. Há mais de 40 dias, com alegria, acompanhamos o restabelecimento, a restituição dos mandatos e a recondução da presidência do CONSEAS. No entanto, no CNDI, à semelhança do governo anterior, somente o titular da Secretaria Nacional conduzirá os trabalhos de recomposição do colegiado”.

Os signatários observam que, “segundo o Art. 11 do referido Decreto, para o biênio 2023-2025, a eleição prevista no art. 5º será convocada pelo Secretário Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, por meio de edital, que estabelecerá as normas e os procedimentos para a sua realização. Mesmo tendo conhecimento que há um colegiado legitimamente eleito em 2018 e destituído meses depois, e mudando o que está definido no organograma do Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania, diferentemente dos demais conselhos do mesmo Ministério, o CNDI passou a integrar estrutura organizacional da Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, limitando o papel politico do colegiado, em outras palavras levando-o à subordinação da Secretaria Nacional”.

“Essa participação concedida”, prossegue a Carta Aberta de ex-presidentes e vice-presidentes do Conselho Nacional, “leva a uma condição passiva da sociedade civil em relação às decisões a serem tomadas pelo Estado, em detrimento de uma participação que reside na autonomia do colegiado, na participação ativa, consciente, na cogestão, enfim, no compartilhamento, como nos é assegurado pela Constituição Federal, e como vem sendo exaustivamente proclamado pelo Senhor Presidente da República”.

O documento complementa: “É por esta forma de participação que lutamos e que queremos, em comunhão com a política de participação social deste Governo Democrático. O sistema democrático prevê instrumentos de controle social sobre as ações as políticas públicas, sendo que os Conselhos de Direitos são fóruns naturais de interlocução entre os cidadãos e os Governos, nos quais ambos debatem e deliberam sobre a formulação e avaliação dessas políticas e das práticas do Estado. O enriquecimento e a consolidação da cultura democrática estão profundamente ligados à participação social. O CNDI, quando legitimamente constituído, sempre atuou para a garantia de direitos e efetivação das políticas públicas em prol das pessoas idosas, por meio da participação de seus integrantes, sejam representantes da sociedade civil, sejam de governo democrático. Portanto, é interesse de todos os brasileiros, de todas as idades, ver fortificados os Conselhos de Direitos, nos três níveis de governo, visto ser deles a competência legal de participar da elaboração das políticas públicas, bem como de realizar o controle social, mediante a fiscalização, por exemplo, do orçamento público destinado as referidas políticas públicas”.

Os signatários concluem assim a Carta Aberta: “Reiteramos nosso interesse em colaborar para a criação de um ambiente político favorável ao diálogo e ao respeito mútuo e, nesse sentido, por entendermos que a cassação do mandato em sua plena vigência foi um ato autoritário e, portanto, por uma questão de legalidade e legitimidade institucional, se faz necessária e urgente a recondução do colegiado então legitimamente eleito, para o término do mandato, mediante o restabelecimento dos termos do Decreto nº 5.109/ 2004, da lavra do Presidente Luis Inácio Lula da Silva, com a devida adequação à atual estrutura ministerial, para a merecida reparação, permitindo aos cassados terminarem sua gestão e restabelecendo a ordem democrática no Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDI). A sociedade civil teve participação expressiva na elaboração do Estatuto da Pessoa Idosa e na criação do CNDI e neste momento de sua reconstrução, não pode ser mera coadjuvante. Acreditando, por fim, ser este o caminho de um governo democrático, de participação, união e reconstrução, onde atos normativos arbitrários e antidemocráticos não podem prevalecer e, acreditando na capacidade deste governo de rever equívocos, os ex-Presidentes e ex-Vice-Presidente do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDI), mais uma vez, se dispõem a dialogar e solicitam uma audiência com o Presidente da República, que ajudamos a eleger, para esclarecer estes pontos de divergência e apresentar pessoalmente a nossa proposta”.

Processo continuou

Após a edição do Decreto 11.483/2023 e apesar das críticas como as que estão expressas na Carta Aberta, teve prosseguimento o processo de escolha dos componentes do Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, agora com a nova sigla CNDPI. No dia 5 de maio, o secretário nacional dos Direitos da Pessoa Idosa, Alexandre da Silva, divulgou o calendário eleitoral para a escolha das entidades da sociedade civil que comporão o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa (CNDPI) para o biênio 2023-2025. A eleição aconteceu no dia 26 de julho.

As críticas ao processo de recomposição do CNDPI continuaram. Uma das principais referências do movimento pelos direitos das pessoas idosas no Brasil, Albamaria Paulino de Campos Abigalil, ex-Secretária Nacional da Promoção Social, ao mesmo tempo em que parabenizou as entidades sociais eleitas para o novo Conselho, manifestou “preocupação e análise crítica face ao processo interrompido da Democracia Participativa relativo à Pessoa Idosa no Brasil”.

Ela lamentou por exemplo o hiato, de sete meses, até a escolha dos componentes do Conselho Nacional de Direitos da Pessoa Idosa, afetando a manifestação do órgão sobre o próximo orçamento plurianual da União. Também protestou contra a não-recondução, pelo novo governo Lula, do CNDI “legítimo anterior” (o Conselho que foi deposto pelo governo Bolsonaro), a exemplo do que ocorreu com o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA). No dia 28 de fevereiro, em cerimônia no Palácio do Planalto, o presidente Lula reempossou conselheiras e conselheiros do CONSEA, extinto em 2019 pelo governo de extrema-direita.

Máster em Gerontologia pela Universidade Europeia de Madri, Albamaria integrava o Conselho Nacional e Defesa dos Direitos das Pessoas Idosas (CNDI) quando o Brasil teve ativa participação no processo de estruturação e aprovação da Convenção Interamericana sobre a Proteção dos Direitos Humanos das Pessoas Idosas. Hoje, Albamaria integra o Núcleo de Estudos e Políticas Social-NEPPOS -UNB e o Grupo de Trabalho de Encelhecimento Saudável e Participativo GETESP -UNB.

Para ela, o processo de recomposição do CNDPI, da forma como foi conduzido, “traz sérios prejuízos às pessoas idosas , entre outros, citamos o hiato para análise, elaboração, proposição e aprovação para o Orçamento e em especial para a elaboração do Plano Plurianual – PPA 2024- 2027”. Na sua avaliação, “fica prejudicado todo o andamento, a implementação, a garantia de direitos, assegurados na Política Nacional do Idoso – Lei 8442/94 e no Estatuto da Pessoa Idosa – Lei 10.173/2003, no âmbito da Federação Brasileira”.

Até se organizar, o novo Conselho “não irá dispor de tempo hábil para análise e aprovação do PPA 2024-2027, verificando se a proposição do referido Plano, pelo Órgão Gestor( SNDPI-MDHC), está em consonância com as Deliberações propostas pelas Quatro Conferências Nacional Legítimas de Defesa de Direitos das Pessoas Idosas, além de hiatos/critérios na representação legítima do CNDI nos Espaços Legítimos assegurados para o democrático controle social”.

Ela entende que “as Ações e Políticas Sociais / Orçamento Público voltadas às Pessoas Idosas e a devida Representação das Pessoas Idosas em Espaços de Conselhos continuam em desvantagens no processo democrático conquistado e assegurado às Pessoas Idosas no Brasil, com árduas lutas , durante quatro décadas de atuação intensa de Defesa de Direitos, Avanços e Retrocessos”. Albamaria Paulino de Campos Abigalil nota que o Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Idosa tem representação em vários órgãos da administração pública e que a demora e a forma como o processo de recomposição se deu prejudicaram essa presença assegura na legislação.

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